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Perspectivas Cidadãs: Sociedade civil defende urgência da tributação dos bilionários

Primeira reportagem da série "Vozes do G20: Perspectivas Cidadãs" traz a visão de especialistas sobre a tributação de super-ricos, vinculada ao combate às pobreza e à crise climática.

Agência Gov | Via G20 Brasil
19/09/2024 12:55
Perspectivas Cidadãs: Sociedade civil defende urgência da tributação dos bilionários
Divulgação/Via G20 Brasil
Protesto em São Paulo pela taxação dos bilionários. Na foto, lê-se: "Contra a fome, taxar os ricaços"

A tributação dos bilionários é central para enfrentar as desigualdades no mundo. O avanço do debate sobre um mecanismo de taxação progressiva nos últimos anos, também em resposta às múltiplas crises recentes, também é objeto de atuação de organizações da sociedade civil. Articulados para o acompanhamento do tema em outros espaços internacionais, como a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e as Nações Unidas, os grupos buscam soluções estruturais para fazer a pauta avançar e fortalecer as economias e as populações dos países, principalmente do Sul Global. 

Livi Gerbase, pesquisadora para a América Latina e Caribe do CICTAR (Centre for International Corporate Tax Accountability and Research), pontua que a desigualdade de renda entre ricos e pobres está em níveis alarmantes e parte do problema é a não-taxação dos bilionários. “O tema se tornou relevante também devido a vários países estarem nos últimos anos, de maneira individual e coletiva, implementando reformas em prol da progressividade dos sistemas tributários, demonstrando que é possível corrigir as lacunas que favorecem os mais ricos e as multinacionais”, defendeu.

Para Viviana Santiago, diretora executiva da Oxfam Brasil, é fundamental uma agenda global para tributação dos bilionários, em um movimento de não tolerância ao intenso processo de concentração de renda na sociedade. Ela pontua ainda a urgência de medidas para evitar fuga de fortunas e a “completa intolerância” aos níveis extremos de desigualdade e que o debate precisa ser realizado imediatamente. 


 Vanessa Oxfam

“Adiar a discussão acerca da tributação dos super ricos, impacta na capacidade global de gestão da crise climática, da fome e da renda justa que possibilite uma vida digna a todas pessoas. Exatamente os recursos que não são cobrados dos super ricos a partir de uma taxação justa, são aqueles que financiaram a questão climática, possibilitaram o aprimoramento das políticas públicas e o financiamento dos sistemas de saúde e assistência social em todo o mundo, que possibilitam o estado redistribuir a renda”, ressaltou Santiago.


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A vez do Sul Global na ONU

Em 2023, as Nações Unidas deram início aos processos de negociação de uma Convenção-Quadro da ONU sobre Cooperação Tributária Internacional. Segundo Florencia Lorenzo, pesquisadora do Tax Justice Network, a ação é importante, pois diferente de outras propostas de reforma tributária que beneficiam países de alta renda, este documento promete medidas mais inclusivas, especialmente para nações do Sul Global. 

A necessidade de a comunidade internacional engajar em debates sobre soluções para as desigualdades provocadas por questões fiscais tem sido uma preocupação de longa data. Outras tentativas foram realizadas na OCDE, com aval do G20, mas apresentaram falhas em considerar as especificidades das pequenas e médias economias.

Lorenzo explica que, muitas vezes, favoreceram as nações mais ricas em processos pouco transparentes e com baixa representação dos países em desenvolvimento. “É difícil exagerar a importância desse instrumento e o quanto estamos esperançosos em relação a essas negociações. Esse processo tem o potencial de mudar a trajetória de um regime que em cem anos tem sido incapaz repetidas vezes de responder à altura aos desafios tributários de seu tempo”, disse Lorenzo.


Livi e Nathalie 

Livi Gerbase (esq): "Desafio é seguir avançando na agenda internacional".
Nathalie Beghin: "Aproveitar as brechas e deslocar o debate para as Nações Unidas"


“É interessante ver a disputa entre os ricos, que não querem perder privilégios, e os empobrecidos, que querem que seus direitos sejam atendidos. Como no G20 tem países que não são necessariamente da Organização, como o Brasil que entre outros defende a tributação do super-ricos, algumas brechas vão se fazendo e isso permite deslocar o debate para as Nações Unidas. Espero que no comunicado final questões como essa sejam tratadas”, analisou a economista.

Financiamento para enfrentar as desigualdades 

Beghin destaca a urgência de mobilizar recursos públicos adicionais para enfrentar esses desafios. A especialista argumenta que, embora seja comum o discurso da escassez de recursos públicos, existem medidas eficazes para gerar novas receitas, como a tributação progressiva e o estabelecimento de regras globais que impeçam, entre outros, a evasão fiscal.

De acordo com a especialista, a proposta de taxar os bilionários não apenas visa alavancar recursos para combater a fome, a pobreza e as mudanças climáticas, mas também garante que esses fundos sejam verdadeiramente públicos. Beghin ressalta a importância dessa distinção: "É crucial que os recursos para enfrentar as consequências das crises sejam públicos, não privados com contratos leoninos que ninguém pode pagar ou que comprometam a vida das pessoas", concluiu. 

Para isso, a sociedade civil internacional tem desempenhado um papel crucial no impulsionamento dos debates sobre a taxação de grandes fortunas. Como destaca a diretora da Oxfam, o movimento é que ao mesmo tempo em que esses grupos pressionam os governos por reformas nos sistemas de tributação locais, estabelece diálogo com toda a população e aumenta o engajamento das pessoas sobre o tema. 

“Quanto mais informação, maior a capacidade de mobilizar pela indignação com a perversidade de sociedades com tamanha concentração de renda. A sociedade civil a partir desses dados também tem pressionado os governos com agendas de trabalho e de incidência que apontam para a necessária reforma nos sistemas tributários dentro dos países e na coalisão global”, pontuou Viviana.

Por uma tributação efetiva 

Livi Gerbase salienta que um dos desafios da tributação dos bilionários é como combiná-la com a taxação das multinacionais e seus dividendos, uma vez que, a maior parte da riqueza dos bilionários deriva da posse de ações nessas empresas, por exemplo. A pesquisadora explica que em 2021, mais de 130 jurisdições concordaram, sob o âmbito da iniciativa Erosão de base e transferência de lucros (Beps) liderada pelo G20 e a OCDE, com um imposto mínimo comum de 15% sobre grandes empresas multinacionais, que começou a ser implementado este ano.

“Este avanço demonstra que é possível também implementar um imposto aos super-ricos. O desafio é seguir avançando na agenda internacional, aperfeiçoando o imposto mínimo comum e implementando a tributação e combinar estes esforços com iniciativas nacionais, para fechar todas as lacunas tributárias que favorecem os mais ricos”, ressalta Livi.

Lorenzo avalia que o formato de um imposto global sobre riqueza ainda precisa ser debatido, já que um imposto que capture apenas os bilionários pode não beneficiar muitos países em desenvolvimento, onde pode haver poucos.“É importante que as ferramentas para combater a desigualdade de riqueza sejam adequadas a diferentes contextos e ajudem a reduzir as desigualdades entre países. Mesmo assim, é um grande avanço ver uma coalizão crescente de países comprometidos com essa questão urgente”, indica.


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