Simone Tebet defende corte de isenções fiscais: 'Mexer com o andar de cima'
Em audiência pública no Congresso, ministra disse também que tributar em pelo menos 10% quem não paga é questão de justiça tributária. "Se isso for discurso de esquerda...", provocou

A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, afirmou nesta terça-feira (8/7) que é chegada a hora de rever as isenções tributárias que existem no Brasil. Na opinião da ministra, trata-se de uma questão de justiça e distribuição de renda. Tebet compareceu a audiência pública na Comissão Mista de Orçamento (CMO) do Congresso Nacional.
Já mexemos muito com o andar de baixo. Nunca se conseguiu mexer com o andar de cima”, disse a ministra.
Essa revisão contribuiria para o aumento da arrecadação, acentuou Tebet, que relatou existirem hoje cerca de 150 tipos de gastos tributários no país. De acordo com a ministra, se fossem cortados 5% dos gastos tributários, seriam recolhidos aos cofres públicos aproximadamente R$ 20 bilhões.
Simone Tebet também destacou que o ano de 2026 será desafiador, mas ressaltou que as metas definidas pelo Governo Federal são factíveis, baseadas em cálculos realistas. Tebet afirmou que o Executivo tem compromisso com o cumprimento das regras do Arcabouço Fiscal e com a sustentabilidade da dívida pública.
A audiência pública na CMO – à qual estiveram presentes o secretário especial da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, e o secretário-executivo do Ministério do Planejamento e Orçamento (MPO), Gustavo Guimarães – foi realizada para o debate do Projeto de Lei das Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026, enviado ao Congresso Nacional em abril. O projeto traz, entre seus destaques, a meta de resultado primário de superávit R$ 34,3 bilhões, o correspondente a 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB).
A projeção é de que as receitas primárias em 2026 atinjam R$ 3,197 trilhões (23,3% do PIB). Desse montante, R$ 2,107 trilhões (15,4% do PIB) se referem às receitas administradas pela Receita Federal. A previsão para as despesas primárias é de R$ 2,593 trilhões (18,9% do PIB), com as despesas obrigatórias atingindo R$ 2,385 trilhões (17,4% do PIB) e as despesas discricionárias ficando em R$ 208 bilhões (1,5% do PIB).
Justiça tributária
Na audiência, que durou aproximadamente duas horas, Simone Tebet discorreu sobre diversos temas. Entre eles, a necessidade de, segundo a ministra, rever isenções tributárias e, também, abolir a cobrança de imposto de renda sobre quem ganha até R$ 5 mil e, em troca, tributar setores mais abastados.
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"Então, a gente tem que ter a seguinte mente: por justiça tributária. Não é preciso muito dinheiro para pagar 22% de tudo o que se ganha, basta alguém ganhar 4 mil reais por mês, um pouco mais que isso, com o líquido, para que todo mês sejam descontados 22%", argumentou Tebet.
"Não é justo que quem tenha mais de 50 mil reais ou 60 mil reais de renda — não se trata de propriedade, outros tipos de benefícios temporários nem indenização; não é nada disso — não pague pelo menos 10% e nós não vamos mexer com quem paga 11%", completou a titular do Planejamento e Orçamento.
Nós estamos dizendo que aqueles que não pagam imposto, ou pagam 3% ou 4%, passem a pagar pelo menos 10%. Se isso não for justiça tributária ou se isso for discurso de esquerda... Eu, que nunca fui de esquerda, tenho de me considerar de esquerda, porque não é possível que a gente entenda isso como algo que fira a suscetibilidade de quem quer que seja. Isso se chama justiça tributária", afirmou
Fazendo referência a seu período como parlamentar, Simone Tebet ressaltou que o Congresso tem se pautado pelo corte de despesas sempre para o lado dos setores sociais mais carentes.
"Se a gente não colocar a mão na consciência de que, nos últimos anos — eu vou colocar 10 anos ou 11 anos, para ser justa, porque eu estava aqui —, fizemos a reforma trabalhista, a reforma da Previdência, todas as medidas que nós fizemos sempre eram pelo lado de políticas sociais. No passado, chegou-se a cortar até dinheiro para ciência, tecnologia, inovação, porque não se acreditava nisso. Tirou-se dinheiro de Farmácia Popular, de políticas sociais e nunca se conseguiu mexer com o andar de cima — ao qual eu pertenço, ao qual muitos de nós pertencemos", afirmou.
Há isenções e isenções
A ministra afirmou defender certas isenções fiscais, desde que gerem empregos, de fato. Simone Tebet recordou que há uma proposta de corte de isenções tributárias que foi elaborada pelo próprio Congresso Nacional.
"Outra proposta que eu sei que é desta Casa — eu levei oito anos trabalhando isso, é um grande desafio — é a questão de se aumentar a receita pelo corte de gastos tributários daqueles incentivos fiscais — e eu sou a favor de incentivos fiscais quando eles atendem ao interesse coletivo, como é o caso do Super Simples —, mas às vezes se tem um incentivo fiscal que foi dado há 40 anos atrás, que atendia, gerava emprego, renda, dinamizava a economia e que hoje atende apenas a pequenos grupos de interesse", disse.
Lembrando do período em que foi presidente da Comissão de Constituição e Justiça, a ministra destacou: "Nós conseguimos colocar na PEC uma alternativa que, na prática, não consegue nos atender, que era reduzir para 2% do PIB os gastos tributários, mas da forma como ficou redigida, por interesses, não resolve, e eu não quero estar na pele das senhoras e dos senhores porque sei que quando se mexe com interesses os lobbies vêm, e aqueles grupos que conseguem fazer lobby fazem pressão, muitas vezes mostram por A mais B que têm razão; outras vezes, não. E a gente não consegue avançar na questão dos gastos tributários".
Clique na imagem para assistir a trecho em que a ministra fala de isenções tributárias:
Na PEC a que a ministra se refere, o corte linear de isenções ficou estipulado em 10%. "Poderíamos fazer um corte linear — não é a melhor medida, mas talvez a possível. Eu mesma fui contra isso no passado. Acho que não é a forma que mais garante justiça tributária, mas, dentro da injustiça que temos hoje, mexer com uma linearidade em alguns desses gastos tributários poderia ser uma alternativa. Mas não se iludam, nós estamos falando de, pelo menos, 150 tipos de gastos tributários no Brasil".
Estrangulamento entre receitas
“As despesas obrigatórias estão estrangulando as discricionárias”, frisou a ministra. Ela apontou que “as receitas não estão superestimadas” e que “as despesas não estão subestimadas”. E acrescentou: “Os cálculos estão muito bem assentados em evidências”.
As despesas obrigatórias são aquelas que o Governo não pode deixar de realizar, por determinação constitucional ou legal. São exemplos: o pagamento de salários e aposentadorias, os encargos da dívida pública e as transferências para estados e municípios. Já as discricionárias dizem respeito às despesas em relação às quais o Governo tem liberdade para decidir sobre a execução.
Em sua exposição aos parlamentares presentes, Simone Tebet confirmou que a projeção de crescimento do PIB em 2026 é de 2,50% (enquanto, para 2025, o aumento previsto é de 2,31%). “Estamos projetando com muito realismo”, declarou a ministra. Sobre o salário-mínimo, atualmente em R$ 1.518,00 e previsto para passar a R$ 1.630,00 em 2026, destacou: “É o maior salário-mínimo dos últimos 50 anos em termos reais”.
Relação do Governo com o Congresso
A ministra aproveitou a ocasião para falar da relação entre o Governo Federal e o Parlamento. Relembrou avanços importantes para o país, resultantes dos esforços conjuntos empreendidos pelos dois Poderes, e elencou a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição, o Arcabouço Fiscal, que substituiu o Teto de Gastos, e a Reforma Tributária, instituída pela Emenda Constitucional 132, promulgada em dezembro de 2023.
“A Reforma Tributária terá um impacto muito positivo no crescimento do PIB”, disse a ministra, que pontuou: “Com serenidade e com diálogo, deixando as diferenças partidárias e ideológicas de lado, e pensando mais naquilo que nos une do que naquilo que nos diferencia, nós temos soluções para todos os reais problemas do Brasil”.
Com informações do Ministério do Planejamento e Orçamento
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