Histórico: ato público marca cumprimento de 1ª sentença de violação de direitos pelo Brasil
Solenidade ocorreu no Palácio do Itamaraty, em Brasília (DF), e representou encerramento do caso do caso Damião Ximenes Lopes
Após mais de uma década e meia da condenação, a Corte Interamericana de Direitos Humanos reconheceu o cumprimento da sentença internacional sofrida pelo Brasil no caso Damião Ximenes Lopes. A decisão, emitida em 25 de setembro deste ano, foi palco para ato público organizado pelos ministérios das Relações Exteriores (MRE) e dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), nesta quinta-feira (26), com a presença do ministro Silvio Almeida.
O evento também contou com a presença da ministra substituta das Relações Exteriores, embaixadora Maria Laura da Rocha; do presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos, Juiz Ricardo Pérez Manrique; e encerrou o caso na Corte.
Em seu discurso, o ministro Silvio Almeida ressaltou a parceria com o Itamaraty. “Esse é um processo fundamental para o que o Brasil possa se consolidar no ponto de vista institucional, democrático e no respeito aos direitos humanos”, frisou.
“Infelizmente, não posso dizer que esse é um fato a ser comemorado, uma vez que o Estado brasileiro levou quase 17 anos para concluir a implementação da sentença. No entanto, no contexto da visita da Corte Interamericana ao Brasil, julgamos pertinente aproveitar a oportunidade para refletir sobre a importância do sistema interamericano de proteção dos direitos humanos como indutor de mudanças estruturais nos países de nossa região”, enfatizou o ministro.
Mudança de paradigma
Silvio Almeida destacou que a promoção do reposicionamento do Brasil perante o Sistema Interamericano de Direitos Humanos, ao lado do Ministério das Relações Exteriores e da Advocacia-Geral da União, foi prioridade logo que o presente governo tomou posse. “Inclusive, por meio da aceleração do cumprimento das decisões proferidas pela Corte Interamericana, entre elas, a sentença do presente caso”, explicou Silvio Almeida.
“O caso Damião Ximenes Lopes é emblemático ao tratar de um tema atualíssimo e que desafia praticamente todos os países do mundo: como promover uma política de saúde mental que respeite plenamente as normas de direitos humanos”, destacou o ministro.
O último ponto da sentença que restava para ser cumprido determinava ao país o estabelecimento de programas de capacitação relacionados à saúde mental, como uma garantia de não-repetição a fim de evitar violações de direitos como as que ocorreram com Damião Ximenes Lopes.
Para dar cumprimento à sentença, o MDHC se comprometeu, ainda dentro das ações dos 100 dias de gestão do governo federal, a lançar um programa de formação sobre a temática. Logo, em abril de 2023, foi lançado, em parceria com a Escola Nacional de Administração Pública (Enap), o curso " Direitos Humanos e Saúde Mental - Curso Permanente Damião Ximenes Lopes ", no qual mais de 13.000 matrículas já foram realizadas, entre servidores públicos das esferas federal, estadual, municipal e distrital, especialistas e pessoas vinculadas a organizações sociais.
“Após o encerramento do primeiro ciclo do curso, em diálogo com a sociedade civil, foi realizada etapa de revisão e foram incorporadas adequações adicionais ao programa que pode, e deve, ser continuamente aprimorado”, explicou.
Ao finalizar seu discurso, Silvio Almeida reiterou o compromisso do MDHC com a justiça internacional diante de graves violações cometidas “Que o encerramento da supervisão de cumprimento da primeira condenação da Corte em relação ao Brasil seja não o fim, mas um recomeço no campo da saúde mental”, concluiu.
Reconhecimento
Para a ministra substituta das Relações Exteriores, embaixadora Maria Laura da Rocha, o caso foi histórico, não apenas por ser o primeiro caso do país na Corte Interamericana de Direitos Humanos, mas também porque permitiu o avanço e o aprofundamento de mudanças no sistema do atendimento psiquiátrico no Brasil. “Estamos reunidos hoje porque vocês não se calaram, porque vocês não desistiram. Recebam o nosso reconhecimento público e gratidão por essa trajetória que representa um passo importante no processo de construção de um Brasil mais humano e que tanto almejamos”, enfatizou ao se dirigir à família de Ximenes Lopes.
Também presente no ato, o presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos, juiz Ricardo Pérez Manrique, fez o reconhecimento simbólico do arquivamento da sentença. “A nossa Corte já proferiu sentenças em 11 casos contra o Brasil, dos quais dois já foram arquivados: em 2012, o Caso Escher; e em outubro deste ano, o caso Ximenes Lopes”
Manrique reforçou que das 11 sentenças brasileiras, ainda temos em etapa de supervisão de cumprimento e 57 reparações. “Gostaríamos de fazer um apelo através dessa mudança de posicionamento do Estado para que possamos continuar a encerrar casos no Brasil”, concluiu.
Participaram ainda do ato, o secretário substituto de Atenção Especializada à Saúde, do Ministério da Saúde, Aristides Vitorino de Oliveira Neto; o Advogado-Geral da União substituto, Flávio José Roman; a secretária-geral do Conselho Nacional de Justiça, Adriana Alves dos Santos Cruz; e a representante dos peticionários da ONG Justiça Global, Daniela Fichino.
Assista à integra da cerimonia
Caso Ximenes Lopes
Trata-se da primeira sentença internacional ao Estado brasileiro relativa a violações de direitos humanos. Em outubro de 1999, o paciente psiquiátrico Damião Ximenes Lopes foi internado na "Casa de Repouso Guararapes", em Sobral (CE), um centro de atendimento psiquiátrico privado contratado pelo Estado para prestar serviços de saúde mental pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Com o curso, o tribunal concluiu que o Brasil deu cumprimento ao último ponto resolutivo em aberto da sentença, relativo à capacitação do pessoal vinculado à atenção de pessoas com deficiência intelectual sobre os direitos e princípios que devem reger seu tratamento.
Entre os outros pontos resolutivos que o Estado brasileiro foi obrigado a cumprir por decisão da Corte IDH estavam a publicação, no Diário Oficial da União ou outro jornal de ampla circulação nacional, do capítulo relativo aos fatos provados da sentença; pagar indenizações em dinheiro às senhoras Albertina Viana Lopes e Irene Ximenes Lopes Miranda, familiares de Damião; e a supervisão, por parte da Corte IDH, do cumprimento íntegro da sentença dando por concluído o caso uma vez que o Estado tenha dado cabal cumprimento ao disposto no processo.
Por: Ministério dos Direitos Humanos (MDHC)
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