Encontros com ministro da Noruega e com presidente do STF marcam último dia da ministra Sonia Guajajara na COP 28
A agenda da ministra dos Povos indígenas incluiu ainda debate sobre financiamento de projetos em Terras Indígenas.
Em seu último dia na COP 28, que segue até 12/12 em Dubai, a ministra Sonia Guajajara participou do “Fórum Internacional dos Povos Indígenas pela Mudança do Clima” juntamente com o ministro do Clima e Meio Ambiente da Noruega, Andreas Bjelland Eriksen, durante o qual celebraram 40 anos de parceria dos dois países nas pautas ambientais.
A ministra agradeceu o apoio da Noruega às políticas ambientais e aos povos indígenas do Brasil, enfatizando a importância da ajuda internacional para o país, e defendeu o financiamento direto para projetos de organizações indígenas. “Embora haja uma abordagem para que os povos indígenas sejam somente beneficiários de ações, a gente está aqui dizendo que nós, povos indígenas, temos sim essa capacidade, o compromisso para fazer a gestão, não só do território, como a gente já faz hoje, mas também dos recursos financeiros”, disse a ministra.
Segundo Sonia Guajajara, o Ministério dos Povo Indígenas (MPI) está estruturando um fundo específico voltado para os povos indígenas de todos os biomas brasileiros a partir da experiência do Fundo Amazônia, cuja maior parte do financiamento vem do governo da Noruega. “Todos os olhares do mundo se voltam para a Amazônia, tanto por parte daqueles que querem proteger, quanto daqueles que querem explorar. E nós entendemos que é importante proteger igualmente todos os biomas”, disse a ministra, destacando a pressão ambiental pela qual passam o cerrado, a mata atlântica, o pantanal, a caatinga e os pampas. “Então nós queremos construir esse fundo para que tenhamos recursos diretos para apoiar as ações de proteção também nesses biomas.”
O ministro norueguês Andreas Bjelland Eriksen disse que a parceria de 40 anos com o Brasil permite um entendimento comum das dificuldades e também das possibilidades da transição que o mundo tem de enfrentar, e que a experiência conjunta pode ser uma ponte para atrair mais atores e fundos para as causas ambientais.
Eriksen reconheceu o papel indígena na preservação do meio ambiente e disse que está impressionado com os resultados que o Brasil tem conseguido na redução do desmatamento, e com a visão holística da ministra Sonia Guajajara em seu trabalho de integrar os povos indígenas nas ações do governo para a preservação e recuperação dos territórios. Para o ministro, é um orgulho que o Fundo Amazônia esteja beneficiando a população indígena por meio de 28 projetos. “É ótimo construir isso e nós estamos ansiosos para entender como podemos olhar para novas ideias, novas soluções, novas formas de cooperar para poder construir e expandir isso daqui para frente”, disse Eriksen.
No evento “Estado de Direito Ambiental e o papel dos juízes na proteção da Floresta Amazônica”, que contou com a participação do ministro Luís Roberto Barroso, presidente, Supremo Tribunal Federal (STF), a ministra Sonia saudou a participação de representantes do Poder Judiciário na COP, espaço no qual o Poder Executivo e a sociedade civil sempre foram majoritários, e destacou a importância dos operadores do Direito entenderem o vínculo que existe entre a proteção do meio ambiente e as garantias dos demais direitos humanos. “Quando falamos de proteção da biodiversidade, nós devemos sempre ter em mente que há uma sociobiodiversidade que jamais deve ser esquecida”, disse. “A floresta existe porque foi e segue sendo milenarmente manejada por grupos humanos que domesticaram suas plantas e animais, que manejam suas sementes e que compõem o ciclo da vida no bioma”.
Segundo a ministra, é neste contexto que se deve garantir a proteção das terras indígenas e que não cabem mais discussões em torno da interpretação do artigo 231 da Constituição Federal, que estabelece os direitos territoriais indígenas. “Garantir a demarcação e a desintrusão de invasores é crucial para a proteção dos biomas, uma vez que estudos demonstram que as terras indígenas, bem como terras de outros povos e comunidades tradicionais, são bolsões de vida, de proteção da biodiversidade e, também, servem de barreiras para o avanço do desmatamento”, disse.
Barroso falou sobre os desafios enfrentados pela pauta ambiental diante de três problemas: a desinformação e o negacionismo dos agentes políticos e da sociedade; o fato de que os efeitos da crise climática serão sentidos mais profundamente nas próximas décadas e as atividades políticas estarem voltadas para o curto prazo; e o aspecto global da crise climática, com acontecimentos extremos que não respeitam fronteiras, embora sejam necessárias ações locais que já foram o foco de três tratados da ONU, ainda sem sucesso.
O ministro destacou a importância global da Amazônia na prestação de grande serviço ambiental ao planeta, por concentrar grande parte da biodiversidade, pelo seu papel no ciclo da água, e na absorção e retenção de carbono. Nesse ponto o ministro disse que não pode haver contraposição entre a preservação da Amazônia e o agronegócio, que no Brasil depende totalmente dos rios voadores formados na floresta. O ministro falou ainda dos interesses econômicos que desafiam a integridade da Amazônia, com o desmatamento e exploração ilegal de madeira, as queimadas para a criação de pastagem, a mineração ilegal, e, mais recentemente, o estabelecimento de rotas de tráfico de drogas e de armas pelo crime organizado.
Nesse contexto, segundo Barroso, o papel do Judiciário é fundamental por tratar, cada vez mais, e em todo o mundo, o direito ambiental como um direito humano, e por tomar decisões que as autoridades políticas e governos têm evitado devido ao custo eleitoral das medidas de proteção ambiental. Além disso, o ministro disse que o Judiciário tem o papel de garantir direitos intergeracionais, considerando que a proteção ambiental significa a proteção de gerações futuras, que ainda não votam e não têm voz.
O ministro admitiu, no entanto, que o cumprimento das decisões judiciais depende dos outros poderes, e citou a resistência que as operações de desintrusão de Terras Indígenas no Pará realizadas pelo governo federal têm enfrentado. “Na verdade [a desintrusão] é simplesmente o cumprimento da Constituição: terra indígena demarcada não pode ser invadida por mineração. Juridicamente a questão é simples”, disse.
Na companhia da secretaria de Gestão Ambiental e Territorial Indígena, Ceiça Pitaguary, outros membros do MPI, e da secretária dos Povos Indígenas do Pará, Puyr Tembé, a ministra se reuniu ainda com diretores do Clarify Funding, organização que desenvolve estratégias e ferramentas para ajudar organizações sem fins lucrativos a acessarem financiamentos para seus projetos. O objetivo foi buscar junto ao Clarify Funding apoio para a implementação dos Programas de Gestão Territorial e Ambiental que estão sendo desenvolvidos pelo MPI em parceria com comunidades indígenas para a gestão de seus territórios, e para um estudo sobre a situação fundiária das terras indígenas no Brasil. Os representantes do Clarify se disponibilizaram a apresentar os projetos ao conselho do fundo para colaboração com o MPI.
Por: Ministério dos Povos Indígenas (MPI)
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