Conferência de saúde do trabalhador consolida foco nos direitos humanos no mundo do trabalho
Participantes delegados e delegadas de todo o país aprovaram 134 diretrizes e 520 propostas, que devem subsidiar a Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora

Com a participação de centenas de pessoas de todos os cantos do País, foi encerrada nesta quinta-feira (21/8) a 5ª Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (5ª CNSTT). Espaço máximo de deliberação do controle social, a conferência contou com 2.486 pessoas participantes credenciados, dos quais 1.559 eram delegados e delegadas eleitos nas etapas municipais, macrorregionais, estaduais e livres, demonstrando a vitalidade e o engajamento da sociedade civil organizada na construção de políticas públicas de saúde.
O tema central da 5ª CNSTT, “Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora como Direito Humano”, foi a espinha dorsal de todos os debates realizados desde as etapas preparatórias, iniciadas no começo desse ano e cujo encerramento foi realizado esta semana, de 18 a 21 de agosto, em Brasília, com transmissão pelo canal do CNS no YouTube .
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Mesa de abertura com a participação do Zé Gotinha
Neste sentido, a proposta da conferência foi estabelecer e fortalecer vínculos entre a saúde dos trabalhadores e os direitos humanos, com objetivo de transcender uma visão restrita de acidentes e doenças ocupacionais, em um contexto após a pandemia de Covid-19 e os retrocessos legislativos recentes como as reformas trabalhista e previdenciária, que retiraram direitos de pessoas que trabalham.
A compreensão de que uma vida digna depende de condições de trabalho que não adoecem, e o reconhecimento de que a violação desse direito é uma das faces mais cruéis da desigualdade social foram basilares para elaborar proposições, que deverão incidir na Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (PNSTT) e nos demais instrumentos de gestão que constituem o Sistema Único de Saúde (SUS).
Dados recentes ilustram a urgência desse debate. De acordo com o Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho (smartlab.br), entre 2012 e 2022, foram registrados 5,6 milhões de acidentes de trabalho no Brasil, resultando em mais de 21.500 mil vidas perdidas. Esses números, que já são subnotificados, revelam uma tragédia silenciosa e cotidiana, onde a saúde é negociada em troca da sobrevivência. E foi contra essa lógica desumana que a conferência se posicionou ao aprovar 134 diretrizes, 520 propostas e 114 moções. Todo esse arcabouço deverá pavimentar o futuro das relações de trabalho no Brasil.
“Esses momentos fazem a gente lembrar o que é essa construção coletiva do SUS. Se alguém tinha dúvida da importância do tema desta conferência, a saúde do trabalhador como direito humano, os quatro dias de conferência traduziram muito bem o que significa isso, especialmente nos dias atuais”, define Agnes Soares da Silva, diretora do Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde, durante sua participação na mesa de encerramento da conferência, na tarde desta quinta (21).
Propostas e Diretrizes
Dos grupos de trabalho e plenárias intensas e democráticas que foram realizadas nos quatro dias de atividades da conferência, surgiram diretrizes e propostas que incidirão diretamente na PNSTT. As proposições aprovadas refletem uma visão integral e contemporânea do mundo do trabalho, onde saúde mental e a redução da jornada de trabalho são questões relevantes e sempre apontadas nos debates.
Dentre as proposições aprovadas, destacam-se, por exemplo, a implantação da Política Nacional de Cuidado Integral com foco na promoção, prevenção e atenção à saúde física e mental; a determinação de criar e fortalecer canais de comunicação e a instituição de uma política nacional de comunicação pública do SUS; a inclusão de informações sobre identidade de gênero e pessoas com deficiência nos sistemas de informação, assegurando que as políticas sejam transversais e contemplem a diversidade da classe trabalhadora; a criação de uma metodologia para vigilância em saúde com participação efetiva do controle social, garantindo que a sociedade fiscalize as condições de trabalho; e garantir cuidado integral e longitudinal por meio da ampliação dos horários de funcionamento das Unidades Básicas de Saúde, adaptando o serviço à realidade de quem trabalha longas jornadas.
Para Jacildo de Siqueira Pinho, coordenador adjunto da 5ª CNSTT, as propostas deliberadas não podem ficar apenas no papel e devem ser conduzidas e trabalhadas de forma permanente. “Que elas sejam efetivadas, porque precisamos trabalhar tudo que vocês trouxeram para os grupos de trabalho e para as plenárias. E não somente essas propostas que chegaram até esta etapa nacional, mas também aquelas que ficaram nos municípios e nos estados. É importante a gente fazer esse monitoramento”.
Mariângela Simão, secretária nacional de Vigilância em Saúde e Ambiente do MS agradeceu o esforço coletivo para que a conferência fosse realizada com excelência. “A luta continua e a vitória é incerta, mas na conferência a vitória certa depende de todos nós”, declarou, agradecendo também à condução da plenária e a equipe de trabalho da comissão de relatoria, responsável por gerenciar toda dinâmica de organização das moções, diretrizes e propostas.
Ao encerrar oficialmente a 5ª CNSTT, Fernanda Magano, presidenta do CNS, agradeceu o ânimo e comprometimento de cada pessoa delegada presente na conferência e apontou que há muito a construir a partir dessas deliberações apontadas, a partir da Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador (Renast) e os Centros de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest).
“Que continuemos produzindo e trabalhando na Renast, junto aos Cerest, levando as questões para os conselhos municipais e estaduais, trocando com o CNS e fazendo que as Comissões Intersetoriais de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora tenham a força devida para mudar as realidades nesse país que é tão grande”.
A presidenta destacou ainda a participação da delegação internacional composta por integrantes de países signatários da Resolução aprovada na OMS sobre participação social. “Essa troca com esses representantes de outros locais do mundo faz valer o que aprovamos na OMS. Que o SUS seja, de fato, exemplo de participação social para o mundo e que essa troca possa trazer mais saúde para todas as pessoas”, finalizou.
Acesse a Rádio Quintal e confira entrevistas com participantes da 5ª CNSTT
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