Bahia celebra projeto de sinalização dos lugares de memória dos africanos escravizados
Projeto reforça políticas de preservação da memória negra e destaca o 23 de agosto como marco internacional de reflexão sobre a escravidão

O Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira (MUNCAB) recebeu, nesta segunda-feira (18/8), a etapa baiana do Projeto de Sinalização e Reconhecimento dos Lugares de Memória dos Africanos Escravizados no Brasil. Coordenada pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, a iniciativa conta com a parceria dos Ministérios da Igualdade Racial, da Cultura, da Educação e da UNESCO. O projeto é baseado no Inventário Nacional dos Lugares de Memória dos Africanos Escravizados no Brasil, publicado em 2013 pela Universidade Federal Fluminense e pela UNESCO.
A Bahia concentra 25 dos cerca de 100 locais contemplados na primeira fase, reforçando seu papel central na história da escravidão no país. O evento incluiu a apresentação do projeto à sociedade civil e uma visita técnica ao Cais da Cidade Baixa, oficialmente reconhecido como ponto de chegada de africanos traficados para o Brasil. Antes da proibição do tráfico atlântico, em 7 de novembro de 1831, o cais recebeu milhares de pessoas escravizadas e continuou a ser usado no tráfico interno e transatlântico.
Moema Carvalho Lima, coordenadora-geral de Memória e Verdade da Escravidão e do Tráfico Transatlântico de Pessoas Escravizadas, apresentou a metodologia do projeto, destacando que o envolvimento das comunidades locais é essencial para garantir o êxito das ações.
Representantes de instituições parceiras, como IPHAN, IPAC e Fundação Gregório de Mattos, destacaram a importância da articulação interinstitucional na preservação da memória afro-brasileira. A Defensoria Pública da União, por meio da coordenadora do Núcleo de Equidade Racial, Dra. Raquel Malta, reforçou a relevância da justiça social na reparação histórica.
O evento também promoveu diálogo com a sociedade civil. A diretora do Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira (MUNCAB), Cintia Maria, ressaltou o papel dos museus como espaços vivos da cultura negra e da memória coletiva. Participantes como Nilma Santos e Sheik Abdul Ahmad reforçaram a necessidade de valorizar os territórios historicamente ocupados por população negra e de manter pontes entre Brasil e África, garantindo que a história não seja apagada. A vereadora Marta Rodrigues (PT) participou da cerimônia e presenteou o Ministério com a placa da Ladeira dos Malês, marco histórico da resistência negra.
Cultura, ancestralidade e compromisso com a memória
Pai Buda, líder religioso do terreiro Roça do Ventura, conduziu uma bênção à ancestralidade negra e saudou os presentes, destacando a importância da preservação das tradições afro-brasileiras.
Em suas palavras, Pai Buda afirmou: “é com muita luta, mas estamos conseguindo que o povo Jeje (grupo de povos africanos, principalmente os Fon, Ewe e Mina) possa preservar e difundir a tradição dos Voduns (divindades cultuadas em religiões de matriz africana)”.
Selma dos Santos, do Centro de Memória da Bahia, destacou a relevância das políticas públicas estaduais voltadas à valorização da memória. Durante a visita técnica, a comunidade pôde conhecer o modelo de placa que será replicado em outros territórios, fortalecendo a preservação histórica local.
A escolha da data do evento reforça seu caráter simbólico. O mês de agosto inclui o 23 de agosto, instituído pela UNESCO como Dia Internacional da Lembrança do Tráfico de Pessoas Escravizadas e da Abolição da Escravatura. A data recorda a revolta de escravizados na noite de 22 para 23 de agosto de 1791, no atual Haiti, episódio que desencadeou a Revolução Haitiana e impulsionou os processos abolicionistas nas Américas.
O projeto de sinalização constitui uma ação concreta de afirmação da memória, de reparação simbólica e de resistência. A iniciativa será expandida para outros estados, reforçando o compromisso do Ministério dos Direitos Humanos com a preservação patrimonial e a valorização da história da população negra no Brasil.
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