Comissão entrega ao Governo do Brasil proposta para modernizar máquina pública
Grupo contou com contribuições da sociedade civil para substituir o Decreto-Lei 200/1967, que organiza a administração pública. Proposta visa criar Lei Geral. Conheça a minuta da proposta
O governo federal, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU) e do Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI), recebeu nesta quinta-feira (18/12) o texto do anteprojeto de revisão do Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967, que dispõe sobre a organização da administração pública federal. O documento foi entregue pela comissão formada por especialistas em gestão e em direito público e por membros da AGU e do MGI.
O Decreto-Lei 200/1967, em vigor há quase 60 anos, é considerado um dos pilares da administração pública federal, estabelecendo as bases para a estrutura organizacional e o funcionamento do Estado brasileiro. No entanto, as demandas contemporâneas por reforma, eficiência, inovação e transparência colocaram em pauta a necessidade de sua atualização.
Como explicou Fernando Coelho, professor do Instituto de Estudos Avançados da USP, o DL 200 reflete “um modelo de Estado burocrático, preocupado com as estruturas e voltadas para dentro”. Hoje, diz, “temos um Estado não só provedor, mas indutor e regulador” e é necessária uma lei que reflita as mudanças pelas quais o Estado e a sociedade passaram ao longo das últimas décadas.
“Estamos falando de uma gestão pública mais participativa, inclusiva e colaborativa, que dialoga com a sociedade civil, com o mercado e entre os entes federativos, sempre com o cidadão no centro das políticas públicas e com um Estado que promove e defende a democracia”, acrescentou Gustavo Henrique Justino, professor da USP e do IDP.
O anteprojeto da Comissão propõe a criação de uma nova Lei Geral da Gestão Pública que coloca a entrega de políticas públicas no centro da administração federal. A proposta é substituir integralmente o Decreto-Lei 200 por uma legislação moderna, que fortaleça as capacidades do Estado de entregar políticas públicas, promova a inovação e confira flexibilidade à gestão, além de ampliar a participação social.
O texto da comissão de especialistas propõe a construção de um novo paradigma jurídico e normativo para a administração pública que incorpore novos institutos e ferramentas legais voltados às políticas públicas, inovação e governança colaborativa.
Entre as inovações sugeridas estão a participação dos usuários na avaliação dos serviços públicos, a possibilidade de a União prestar assistência técnica a estados e municípios na busca e utilização de recursos federais e, ainda, o compartilhamento de dados entre os entes e órgãos públicos nos três níveis da Federação. A mudança da visão anterior, no qual a União tinha um papel preponderante e centralizador, cede espaço para um modelo de cooperação federativa em todo o ciclo das políticas públicas, Fernando Coelho explicou
A comissão, instalada em maio de 2024, teve como diretrizes tornar a legislação compatível com a Constituição Federal de 1988, modernizar o serviço público, dar eficiência e democratizar o Estado, além de melhorar a capacidade de produzir políticas públicas para dar respostas concretas à população.
Recepção do projeto
Ao comentar a entrega do anteprojeto, a ministra da Gestão, Esther Dweck, destacou que a revisão do Decreto-Lei nº 200 resultou de um processo iniciado em 2023 a partir de um seminário promovido pela AGU e que evoluiu para além de uma simples atualização normativa. “Não se tratava apenas de revisar artigo por artigo, mas de reconhecer que, após quase 60 anos, o Estado brasileiro mudou e precisava de uma nova forma de articulação entre o direito administrativo e a gestão pública”, afirmou.
A ministra também ressaltou que o anteprojeto dialoga diretamente com a agenda de Transformação do Estado conduzida pelo MGI, ao incorporar princípios como participação social, inovação e fortalecimento das capacidades estatais. “É um texto que olha para os próximos 60 anos e ajuda a dar respaldo jurídico a um Estado mais cooperativo, inovador e orientado à entrega de políticas públicas, com foco no serviço às pessoas”, concluiu.
O ministro da Advocacia-Geral da União, Jorge Messias, afirmou que a conclusão do texto representa uma etapa fundamental de um processo construído ao longo dos últimos dois anos, com participação ampla e valorização de diferentes saberes. “Quando a gente faz as coisas com seriedade e de forma democrática, precisa ter responsabilidade na construção. Aqui não tem só gestão ou só advocacia, mas uma série de saberes mobilizados para um texto que deve servir à sociedade, como a Constituição de 1988 nos convida”, afirmou.
Segundo o ministro, a proposta busca superar limites de um modelo que já não reflete o espírito do tempo e reposicionar o Estado a partir da centralidade do cidadão. “A Constituição deixa claro que primeiro vêm a dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais. O cidadão é o fim, o Estado é o meio. Esse texto mobiliza princípios e instrumentos voltados às necessidades modernas da cidadania, sem aprisionar o gestor e com uma visão de Estado a serviço das pessoas”, concluiu.
O secretário extraordinário para a Transformação do Estado (SETE/MGI), Francisco Gaetani, destacou o caráter coletivo e gradual do processo de construção do anteprojeto. “Chegamos até aqui em um processo de muita discussão, de muita inovação e também de celebração. No governo ninguém faz nada sozinho. Essa foi uma construção com apoio de muita gente, dentro e fora do governo, em um caminho incremental, enfrentando os debates no devido processo e com paciência”, afirmou.
A procuradora-geral da União, Clarice Costa Calixto, destacou o trabalho desenvolvido pela comissão e o papel técnico dos integrantes no processo. “Tivemos debates muito bons ao longo desse período e chegamos ao final com a sensação de dever cumprido em relação à encomenda de mergulhar nos temas e tentar construir uma nova Lei Geral da Gestão Pública, revisando o Decreto-Lei nº 200 e propondo uma virada de visão na gestão pública brasileira, rumo à inovação e a colocar as pessoas no centro da nossa atuação”, afirmou.
A comissão de especialistas contou com 20 integrantes, sendo 12 deles da sociedade civil, três da AGU e dois do MGI, além de um representante da Controladoria-Geral da União (CGU) e dois do Ministério do Planejamento e Orçamento (MPO). Além de reuniões periódicas, foram promovidos seminários em que a Comissão ouviu 53 especialistas em quatro eixos temáticos: Parcerias em Políticas Públicas; Governança, Planejamento e Orçamento; Estrutura Organizacional; e Inovação e Controle.
Próximos passos
O anteprojeto da comissão de especialistas agora será submetido à avaliação do governo federal. A AGU e o MGI participam desse processo em conjunto com os demais ministérios e a Presidência da República. Ao fim da análise, caberá ao governo federal decidir sobre a apresentação de um projeto de lei ao Congresso Nacional. O governo poderá apresentar modificações no texto proposto pela comissão de especialistas.
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